quarta-feira, 24 de dezembro de 2008

O primeiro Natal sem o telefonema do Amigo...







Neste ano perdi um grande amigo...

Um imenso brasileiro...

Tive o privilégio de conviver com um homem incomum...

Uma referência pessoal que opinava sobre minhas brigas pessoais e ideológicas que muitas vezes não compactuava...

Certa vez meu filho adolescente fez um comentário curioso:

- Pai, nunca vi você escutar alguém com tanta atenção sem interromper...

Era o mesmo respeito que eu devolvia ao amigo que me ouvia atento e acompanhava o que eu escrevia e guardava em uma pasta de sua escrivaninha numa admiração que eu nunca alcancei...

Coronel Luiz Gonzaga de Moura foi um desses heróis raros que nossa Pátria não tem competência de reverenciar...

Durante nossas conversas me contou detalhes de sua estada na Itália – onde comandou um pelotão de reconhecimento (a tropa que avança abrindo caminho desbravando o desconhecido; onde teve o desgosto de abraçar diversas metades de corpos de seus comandados trucidados por minas terrestres) – sem nunca recuar...

Cel Moura recusava-se o título de ‘herói’...

Achava que apenas cumpria sua missão necessária...

Um homem incomum...

Meu amigo...

Achava que jamais morreria...

Somente me convenci quando estive em sua missa de sétimo dia na pequena capela da rua do final do Leme, perto de onde morava...

Sua filha, a jornalista Leila Richers, leu – ao lado do altar – uma mensagem com a voz trêmula de emoção a despedida ao Velho Coronel...

Difícil acreditar que alguém tão grande tenha a incompetência de morrer...

Coronel Moura brincava sobre a morte...

Não queria ficar no Mausoléu da FEB...

Havia adquirido uma última pousada no Memorial do Carmo ali no Cajú...

Com vista para a baía da Guanabara...

Me mostrou o ponto exato quanto atravessávamos a Ponte Rio Niterói, retornando de Cachoeiras de Macacu depois de almoçar no Restaurante de Dona Carminha...

Comentava que ficaria eternamente olhando o Rio de Janeiro...

- Pô, Coronel, o senhor não tem medo de ser enterrado vivo?
- Claro que sim!
- Vai que o senhor não morreu ainda?
- Vou levar dois celulares no caixão...
- Ótimo!
- Se ainda estiver vivo te ligo... Por favor corre pra lá e me resgata...
- Combinado...

Não ligou...

Vida que segue...

Durante o tempo que convivemos nunca falei do quanto lhe admirava...

Aquelas idiotices de envergonhar-se de declarar nossa admiração...

Quase no final, sem saber que seria o seu final, deixei em sua portaria um texto meio constrangido pela babaquice tentando não transparecer puxa-saquismo já que éramos senhores da guerra sem lágrimas fúteis...

Coronel Moura ficou tão emocionado que quase não reconheci sua voz ao telefone logo após receber a correspondência que lhe foi retirada da mão pela família para ser xerocada como um relíquia e quando percebi a repercussão fui checar os erros grotescos de gramática que me deixou encabulado pelas barbaridades com o vocábulo mas nunca com a sinceridade...

Ufa...

Tive tempo de dizer com todas letras, em vida, o quanto o Brasil necessita de brasileiros de verdade...

O tempo me contemplou proporcionar uma façanha que Cel Moura advertiu: “você não deveria fazer isto com um homem da minha idade, é muita emoção”...

Natal é um tempo cheio de recordações...

Desculpem...



Jorge Schweitzer

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